📝 A Linha do Tempo do Ninho 📝
🌿Enquanto isso, nas margens do rio, na clareira do Vale, próximo de sua toca:
🐾— Mãe, por que o rio ficou triste com a história dos lápis? — perguntou o filhote, com folhas verde grudadas tremendo nas patinhas.
🦦— Porque, meu filho, — respondeu a mãe, uma toupeira velha de olhos atentos —, o rio gosta de ordem. E quando alguém entrega um papel com data e nome e a árvore responde com risadas, o rio entorta as águas.
🍂— Conta outra vez, mãe. Fala da folha com data, aquele em que os sábios não souberam interpretar seu conteúdo — pediu o filhote.
📄— Pois bem: havia uma folha entregue numa manhã — escrita limpa, clara, objetiva, filhote, com letras firmes (27/92/2075). Era um relato, simples como um pedaço de pão: a mãe trouxe um pergaminho, pediu que o filhote recebesse a lembrancinha e que não se perdesse das tarefas por conta da doença.
💨— Depois? — o filhote insistiu.
🌳— Depois, — disse a mãe, rosnando de leve —, a árvore olhou para o papel e o dobrou com desprezo. Mandou o mensageiro procurar o corvo da vigia; este disse que não havia necessidade. Logo em seguida, o vento levou risadinhas pelos corredores — risadinhas que valem tanto quanto pedrinhas jogadas numa poça: fazem ondas.
🏠— E a tal salinha? — perguntou o filhote, já farejando contradição.
🦉— Ah, a salinha! — a mãe riu com amargura. — A coruja prometeu uma salinha que existiria “depois”. Disse que ali haveria caixas, mapas, cola e um trabalho de “controle” — que era um eufemismo para mandar-te ao canto. Prometeu, riu e nunca fez. A promessa virou fumaça; a fumaça virou conversa de corvo; os corvos riram e apontaram: "É só organização". Só que organização sem papel, sem nome, sem ata, é só teatro.
👀— Te disseram isso na frente da árvore? — o filhote olhou com os olhos brilhando.
😂— Sim. E havia quem gargalhasse, meu pequeno. Gargalhadas que ecoaram como chuva de pedra. Alguém chegou a perguntar: “Não disse na reunião que já tinha salinha?” — e a coruja negou. Mentiu com pena no bico.
❌— Mentira? — o filhote fungou.
⚠️— Mentira. E a mentira é uma trilha perigosa: quando a árvore mente sobre ter feito algo, e depois diz que vai “resolver no fim do ano”, temos aí mais que desmazelo. É abandono de função — porque a árvore inventa tarefas sem o papel que as legitime. É um tapa na regra do bosque.
📝— Mas o que eu fiz, mãe? — o filhote quis saber.
📚— Foste esperto. Guardaste o som das palavras; gravaste a voz; transformaste gargalhadas em prova. Fizeste um pergaminho, filhote, e nele puseste datas, nomes e quem riu. Não é vingança — é linha do tempo. É o mapa que o rio precisa para entender a corrente.
🌊— E o que o rio fará com isso? — sussurrou o filhote.
🪞— O rio levará aos peixes que decidem — disse a mãe, calma. — O observatório do Albatroz, o Conselho das Corujas e até o Grande Ministério do Lago. Tu não jogas barro. Tu mostras o buraco. E quando vários olhos olharem o buraco, a árvore terá menos onde sentar.
🌬️— Mas e se a árvore ficar brava? — tremia o filhote.
🌱— A árvore pode chiar, bater asa, tentar te empurrar para mais longe. Mas quando tu tens papel, gravação e testemunha, até as sementes recordam que a justiça pode vir devagar — mas vem. Nós vamos empilhar provas, meu filho. Cada caneta que sumiu será uma prova. Cada risada que atravessou o corredor será testemunha. Cada promessa não cumprida, um capítulo.
📜— E quando o rio vier ler o pergaminho? — o filhote fechou os olhos, imaginando a clareira lotada.
⚖️— A floresta entenderá que ali há mais que um incidente. Haverá padrão. E padrão é coisa que se julga. E quando o padrão for mostrado, a administração não terá mais espaço para o poleiro podre.
✋O filhote colocou a pata sobre o pergaminho, firme.
🗂️— Então não farei barulho. Vou fazer arquivo.
🦦— Isso mesmo — disse a mãe. — Arquivo é arma de paciência. E paciência, meu rato, é o veneno que corrói a mentira. — E lembre-se, filhote: vamos ver até onde certos servidores das sombras continuarão brincando de servir ao povo entregando farsas em vez de trabalho real. Hoje é o mensageiro; amanhã pode ser você, leitor. Até aqui, estão todos prevaricando, sem exceção! Pense nisso! — completou a mãe, com um olhar que cortava como lâmina.
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